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Fraude no INSS causa prejuízo de R$ 9 milhões. Você sabe porque isso continua ocorrendo? 30/04/2010

Posted by linomartins in Anotações.
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“Será preciso um pouco de sangue verdadeiro para manifestar a crueldade?”

Antonin Artaud, Le théâtre et la cruauté”, maio de 1933.

 O Estadão de hoje (29/04/2010) noticia que o Ministério Público Federal em Guarulhos denunciou oito pessoas de pertencer a uma quadrilha que fraudava o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A pergunta que fazemos daqui do nosso OBSERVATÓRIO DE CONTROLE é porque isto acontece sistematicamente em que pese CPIs, prisões e qualquer levantamento mostrará que, nos últimos anos, diversos personagens e suas quadrilhas tiveram, pelo menos, seus nomes levados para o noticiário e, pelo que se sabe, alguns foram indiciados e condenados.

 A impressão que sempre fica  é certa preferência pela espetacularização do problema que, ao longo do tempo, vai sendo reproduzido sem que se pense, por exemplo, em exigir dos órgãos públicos envolvidos a implementação de mecanismos de controle que, de modo consistente, estabeleçam os parâmetros para de avaliação e gestão de riscos que, pelo menos, sejam a garantia de que os próprios sistemas internos sejam capazes de evidenciar os desvios.

 A preocupação deste Blog é  sempre  com o fortalecimento das instituições e não com as pessoas. Entretanto, lamentavelmente, o que tem sido observado é uma busca incessante dos culpados, com a qual estamos de pleno acordo, mas sem preocupação institucional de buscar, de modo permanente, a melhoria dos processos de trabalho das organizações vitimas de mãos gestores  que, ainda hoje, são partidários das “capitanias hereditárias” mediante a cotização de espaços na administração,  com o objetivo de práticas corruptas no melhor estilo da administração patrimonialista que todos condenamos.

 Ao tratar do assunto este Blog não pode deixar de recomendar a leitura dos estudos de CARRARO[1] (2007) que mostram uma importante reflexão sobre os modelos econômicos de corrupção com a constataçao de alguns equívocos ao dar tratamento exclusivamente personalista  quando da ocorrência de desvio de recursos públicos ou da criação de grupos de interesse dentro do governo. Neste sentido alerta que tais noticias e denuncias partem da falsa premissa de que o problema das falhas são do individuo e qualquer caso de corrupção resolve-se pelo seu afastamento. As próprias autoridades quando se vêem às voltas com algum caso de corrupção oferecem ao sacrifício os “culpados” na aparente esperança de que feito isso tudo estará resolvido.

Ocorre que o problema não é o indivíduo e, por conseqüência, esse tratamento  esta profundamente equivocado, pois o problema está na instituição e nos incentivos que estas pessoas recebem quando estão dentro das organizações, como ensina CARRARO ao concluir que  retirar alguém do governo não elimina o problema e, apenas, indica uma queima de capital humano e político que foi formado muitas vezes ao longo de muitos anos.

A corrupção indica o ato ou efeito de corromper, decomposição, perversão, suborno, peita[2] que traduz uma relação especifica entre o governo e a sociedade para uso ilegal  do poder político e financeiro com os seguintes objetivos:

a) Violação das normas e da legislação da administração publica

b) Utilização ilegal de bens públicos para fins privados

c) Uso da posição publica para obtenção de benefícios privados.

O assunto não é novo e tem ensejado acalorados debates teóricos que vêm desde o inicio da década de 60 quando se entendia que a corrupção facilitava o crescimento economico, pois diminuia o custo da burocracia, até à década de 80 quando os estudiosos iniciaram pesquisas e produziram debates em sentido completamente oposto de que a corrupção dificulta o crescimento economico, pois ela gera alocações ineficientes dos recursos economicos na sociedade.

Durante a realização do Seminário Brasil-Europa de prevenção da corrupção BRESSON (2007)[3],  ao apresentar o tema da “velha corrupção”, esclareceu que no começo dos anos 1960 os relatos sobre a dificuldade de acabar com a corrupção, durante mais de vinte anos, alimentaram a polêmica sobre os supostos efeitos tônicos ou tóxicos da corrupção. Conforme o papel atribuído ao estado na transição das sociedades “arcaicas” para a “modernidade”, explicava-se em grande parte se ele deveria adotar uma posição tolerante ou inflexível face à corrupção. Tal debate mostrava que o dirigismo econômico e o autoritarismo político eram os dois fatos comumente destacados pelos autores que viam funções positivas na corrupção.

Por sua vez os estudos de CARRARO revelam a existencia de três modelos de corrupção, a saber:

a) Teoria econômica do crime em que a corrupção é um crime no qual o criminoso atua de modo racional e ao invez de trabalhar prefere assaltar as pessoas porque com isto racionaliza sua renda.

b) Modelo do agente principal ou de seleção adversa que ocorre porque os governos, para fiscalizar contratam fiscais e criam entidades cuja função é dar suporte à fiscalização que envolve o manuseio de uma informação incompleta.

c) Modelo da corrupção como um problema de estrutura no mercado de oferta de bens e serviços públicos que ocorre quando o bem público sobre a qual o funcionário tem dominio se torna um bem privado e, por consequência, cabe ao funcionário decidir quem será excluido da prestação de serviços ou multado e principalmente quem não terá o aborrecimento de procurar um serviço privado e os custos de uma autuação fiscal.

Ao trata da teoria do crime econômico como fenômeno organizado, sistemático e geograficamente global e referindo-se à situação de Portugal, MORGADO (2003:27) esclarece as dificuldades de atuação do Estado:

“A explosão desta criminalidade, verificada pelo crescimento do número de redes organizadas e pela empresarialização do crime, é uma das conseqüências negativas da globalização da economia e da inexistência de uma fiscalização e repressão também ela global, já que a administração da Justiça e da Lei continua a ser incumbência dos Estados, ou seja, aplicada a nível nacional e local, de acordo com mecanismos territorialmente delimitados.”

 Finalmente, não será demais perguntar porque motivo além de punir exemplarmente os culpados não se exige que os titulares dos órgãos implementem mecanismos inibidores em seus sistemas estruturantes.

 


[1] CARRARO, Andre. Modelos Economicos e Corrupção:possíveis causas e conseqüências. Cadernos da Controladoria, ano VII n° 4. Rio de Janeiro:CGM, 2007.

[2] FERREIRA, Aurelio Buarque de Holanda. Miniaurelio Século XXI. 4ª. Ed. Rev. ampliada. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000.

[3] BRASIL, Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Gestão. Comissão Européia. Seminário Brasil-Europa de prevenção da corrupção: textos de referencia. Brasilia: MP, 2007.